Um percurso pela arte contemporânea portuguesa, no meio do Oceano Atlântico
Agência EFE
20-10-2015 Link da notíciaNo meio do Atlântico, principal palco das expedições marítimas portuguesas, o Centro de Arte Contemporânea dos Açores, “Arquipélago”, acolhe uma exposição que faz um percurso pelo melhor da vanguarda artística portuguesa desde os anos 80.
Sob o título “Um horizonte de proximidades”, a exposição reúne metade da coleção privada de arte contemporânea António Cachola, com mais de 100 obras de 38 artistas.
Numa espécie de travessia, o que caracteriza as rotas e pontos de convergência entre as obras é, sobretudo, a relação com o espaço e com as temáticas experimentadas pelos artistas portuguesas.
Entre eles figuram Rui Chafes, José Pedro Croft, Pedro Cabrita Reis, Fernanda Fragateiro, Francisco Tropa ou João Onofre.
Como se o Centro Arquipélago fosse um grande corpo orgânico, a exposição está dividida em seis ambientes, nos quais se misturam os mais diversos suportes artísticos.
Na primeira sala, segundo explica o curador Sérgio Mah, o painel de apresentação e os objetos instalados revelam o caráter “topográfico” e “geológico” da exposição.
“O horizonte é inevitável quando se está numa ilha. Por isso, sugere-se esta ideia de território pela conexão que há entre as obras”, explica Mah, em entrevista à EFE.
No seguinte espaço está a primeira zona temática da exposição, ligada aos conceitos de construção, reconstrução e arquitetura, e na qual as obras exploram “a ideia que os lugares são espaços onde se guardam memórias, ao mesmo tempo que as estruturas representam essa tensão entre equilíbrio e desequilíbrio”, comenta o curador.
O corpo, os gestos e a linguagem são o tema da segunda sala, com obras sobre a violência, -como a escultura “Doce calma ou violência doméstica”, de Fernanda Fragrateiro ou o painel fotográfico “Anatomia e boxe”, de Jorge Molder- e outras sobre identidade, relações familiares e sonhos.
Há também uma sala dedicada ao género da paisagem, a parte da exposição mais diretamente ligada aos Açores, lugar onde “a relação com a paisagem não é só através dos olhos. O corpo sente a meteorologia, a humidade, o movimento da luz e da própria geologia”, ressalta Mah.
Entre telas em acrílico, óleo e grafite, a sala exibe ainda as imagens de Augusto Alves da Silva, fotógrafo que captou o momento no qual os aviões dos então líderes dos EUA, Reino Unido e Espanha (George W. Bush, Tony Blair e José María Aznar) se preparavam para aterrar na base aérea das Lajes, na ilha Terceira.
Ali, em março de 2003, realizaram a histórica Cimeira dos Açores na qual ultimaram os detalhes da invasão do Iraque.
“São imagens sobre os tempos contemporâneos, num lugar maravilhoso, onde se decide o início de uma guerra. A relação da paisagem com a política retrata, de alguma forma, que a aparência não faz justiça à condição política dessa obra”, argumentou o curador.
O espaço seguinte, com uma perspectiva mais abstrata e geométrica, acolhe uma curiosa obra de Rui Valério, uma composição labiríntica com fita de cassete e pregos.
Já no andar superior do centro, uma atmosfera mais lúdica dá espaço às formas mais contemporâneas de comunicação e mais carregadas de crítica ideológica e ironia, assim como às composições de Patrícia Garrido, com fotografias que registam uma performance nas quais ela própria distribui novelos de lã entre as salas de um apartamento.
A exposição chega até ao porão do edifício, espaço reservado para obras que interagem com a luz e com o tempo, em formatos de instalações, esculturas e projeções.
Entre elas, destacam-se as esculturas em ferro de Rui Chafes e uma das primeiras obras de João Onofre.
O centro Arquipélago, inaugurado no passado mês de março, encontra-se na cidade de Ribeira Grande, na ilha de São Miguel, a principal dos Açores.
O complexo, uma obra de arte em si própria, integra edifícios novos e outros reabilitados numa área de cerca seis mil metros quadrados, onde antes havia uma antiga fábrica de tabaco e destiladora de álcool, ao norte da maior das ilhas dos Açores.
Bárbara Pereira